Ia escrever uma mensagem para os meus visitantes coreanos, sempre assíduos, não esquecendo o indivíduo albicastrense, cuja identidade desconheço mas que já é da casa:
Olá, amigos coreanos (e também de Castelo Branco). Não sei que vêm aqui fazer tantas vezes, mas espero que esteja tudo do vosso agrado.
A minha ideia era converter isto para:
안녕하세요 한국 친구 (그리고 화이트 캐슬). 나는 자주 여기에서 오는 사람들을 알고 있지만, 모든 것을 원하는대로 희망하지 않습니다.
Quando, pelo sim, pelo não, retroverti o texto, apercebi-me de que poderia estar a dizer isto:
Olá amigo Coreia (e Castelo Branco). Sei que as pessoas que vêm aqui muitas vezes, mas eu não quero tudo.
E isto não pode ser. Porque eu quero sempre tudo. Espero que compreendam.
«O prestígio é uma armadilha dos nossos semelhantes. Um artista consciente saberá que o êxito é prejuízo. Deve-se estar disponível para decepcionar os que confiaram em nós. Decepcionar é garantir o movimento. A confiança dos outros diz-lhes respeito. A nós mesmos diz respeito outra espécie de confiança. A de que somos insubstituíveis na nossa aventura e de que ninguém a fará por nós. De que ela se fará à margem da confiança alheia.»Herberto Helder, 1964, em entrevista a Fernando Ribeiro de Mello.Herberto Helder, um homem que não fala, poema.
Preciso de um calendário mensal de secretária para manter o passo com o mundo e para não voltar os olhos semicerrados para o canto inferior direito do ecrã de cada vez que quero saber a quantas ando, andei ou andarei. Varri a internet em busca de um, mas nada: ou demasiado grandes ou sem espaço para escrever. Ponderei até comprar um com motivos infantis e um com imagens de comboios ingleses, mas acabavam por não preencher os requisitos de dimensões, espaço para notas e afins. Foi então que os anjos cantaram e eu encontrei o calendário quase perfeito – nas medidas, no aspecto, na funcionalidade, na simplicidade e na qualidade dos materiais. Além disso, era barato e de dois anos (!). Mas. Como não haver um mas? As semanas começam ao domingo. E as minhas semanas não começam ao domingo. Nunca começaram e não quero que venham a começar. Mais de metade dos calendários mensais que aí andam anda ao engano. Mesmo assim, pensei em adaptar-me. Olhei para ele durante vários minutos, guardei-o nos favoritos para voltar a olhar para ele uns dias depois. Não dá. Não consigo fingir que a semana começa ao domingo (nunca! ouviram?), os meus olhos não conseguem desver o que já viram e violentar-me desta maneira durante dois anos seria uma enorme falta de respeito para com os meus princípios, por muito ridículos que sejam e por muito bonito que seja o calendário (que o é).
O mais provável é que não venha a encontrar o calendário que quero. O mais provável é que, em Junho, eu ainda ande a entrar em todas as papelarias que encontre a perguntar o que têm. Pensei em imprimir qualquer coisa, mas não gosto de folhas soltas ou moles para este efeito. Ou é como preciso que seja ou não é. Neste início de ano, ser capaz de ser inflexível, ver-me com estas exigências com tanto de infantil como de sapiente, é uma vitória. A segurança interna que hoje sinto para rejeitar o que não está à minha altura é cada vez maior. 2014 poderá vir a ser um ano difícil, mas não será um ano mau.